domingo, 26 de abril de 2020

Terminei o meu post anterior dizendo que já não sei mais viver sem nossos encontros de terça-feira às 20h00 na casa da Maria Alice. Somo a esse dizer o vídeo postado pela Maria Alice mostrando a sala  onde bordamos vazia e também o post da Rioco com comentários sobre o nosso primeiro encontro virtual para refletir um pouco sobre esse vazio que estamos sentindo devido a quarentena para evitar a propagação do coronavírus. Os nossos encontros de bordado, desde o início do grupo,  acontecem na sala de estar da Maria Alice, salvo algumas exceções onde transferimos os encontros para a sala de estar da Cristina. São quase 20 anos que isso acontece assim. O que isso representa para cada uma de nós? Para tentar responder vou descrever mais ou menos como as coisas acontecem semanalmente:
toda terça-feira, das 20h às 22h, nos encontramos na casa de Maria Alice, que é casada com o Fernando, tem duas filhas adolescentes, Gabriela e Graziela, uma cachorrinha chamada Ginja, e conta com a ajuda da Val, a secretária do lar que antes de ir embora prepara quitutes deliciosos que se juntam com o que cada de uma de nós possa ter levado naquela noite para lancharmos. Existe uma dinâmica familiar que nunca é suspensa nas noites dos encontros: Maria Alice e Fernando chegam do trabalho pouco antes das 20h, as meninas estão em casa e, enquanto vamos chegando e nos instalando na sala de visitas, a família está reunida na cozinha para o jantar. O encontro do bordado acontece ao mesmo tempo que as atividades da rotina da casa. Chegamos, instalamo-nos e começamos a bordar. Nada parece ser modificado na dinâmica da família: as conversas na mesa do jantar, as eventuais “broncas” nas meninas, a arrumação da cozinha, a organização das compras possivelmente realizadas, os telefonemas, entre outros eventos do cotidiano de uma família. O bordado estabelece outro território que convive paralela e harmoniosamente com o território familiar. Isso se repete a cada semana, como um ritual.   Assim o grupo Teia de Aranha, nesse espaço-temporal constrói o território existencial: a sala de estar da casa de Maria Alice, às terças-feiras, das 20h às 22h. Podemos dizer que a sala de estar nesse momento se configura como um “fora/dentro” da casa, um espaço existencial envolvido pela casa, mas que escapa às suas dinâmicas; mas também como um “fora/dentro” da sociedade, em relação a seus modos de cuidado e foi exatamente isso que me interessou na minha pesquisa. No grupo Teia de Aranha, o cuidado é tecido no plano de relações produzido nesse território existencial. Cuidado tecido a partir do estar junto, do acolhimento às diferenças e também na abertura para a produção da diferença por meio do encontro. É neste momento, através do gesto de bordar entre amigas, que nos atentamos às coisas mínimas e cotidianas que valem a pena serem vividas e é neste momento que se dá o cuidado com a VIDA. Penso que seja esse o motivo de sentirmos tanta falta dos nossos encontros, justamente nesse período em que a VIDA vem sendo tratada com tanta negligencia por quem se encontra em cargos de poder. 

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